Caros amigos,
Ontem meu pai teria completado 100 anos de vida (nasceu em 27/06/1915 e faleceu em 11/08/1979, véspera do dia dos pais) e a maior parte dos que sabem algo sobre ele, o sabem através da idealização e construção do “Einstein”. Tentarei nestas linhas dar algumas outras dimensões do que foi esta vida tão rica.
Existe uma palavra em alemão: “Festschrift” que é aproximadamente significa um “livro de homenagem a uma pessoa”. A medida que se aproximava esta data, meu primo Marcio Pitliuk se propôs a fazer um livro sobre a vida de meu pai, mas infelizmente não consegui a concordância e autorização de meus parentes, assim eu estou inovando e criando um “e-mail de homenagem”
Muitos destes fatos são apenas lembranças que tenho, e sua veracidade pode não ser total (mas quando a versão de um fato for mais interessante que a realidade, fique com a versão), assim peço desculpas antecipadamente por falhas, lapsos e confusões.
I) As Origens, Família e Nomes:
1) Família Tabacow Hidal
a. Se originam da Bessarabia, região que hoje deve ficar na Republica da Moldavia e vem de uma pequena cidade chamada “Sucoron” (existem varias grafias). Dizem que era um “Shtetl” (vilarejo como no filme “Um Violinista no Telhado). Interessante é que no Cemitério Israelita da Vila Mariana, uma boa parte das sepulturas são de pessoas vindas de lá.
b. Há uma possibilidade de que o nome original seja “Tabachnik”.
c. Mas na região de onde eles vem efetivamente se plantava tabaco (mas que veio do Novo Mundo), e como uma das origens de nomes esta ligada a profissões, efetivamente o nome pode estar ligado a profissão: Comerciante de Tabaco (nesta linha me pergunto se meu Bisavô Simpson Feffer, que na verdade era Pfeffer, trabalhava com pimenta).
d. A família do querido Boris Tabacof vem da mesma região que os meus antepassados e possivelmente sejamos parentes (por via das duvidas, nos tratamos como “primos”).
e. Meu Tataravô (ou trisavô) era Nathan (Nute) Tabacow (1836 -1920) Era casado com Anita. Sei pouco deles, tiveram 6 filhos, sendo um deles, meu Bisavô José. Tem a “honra” de ter sido a primeira pessoa a ser enterrada no Cemitério da “Vila Mariana”.
f. José Tabacow Hidal (1871 -1939), é o primeiro a ter este sobrenome Hidal. A estória que conheço é que ele se chamava na verdade Idel Tabacow Quando chegou ao Brasil, ao ser perguntado pela imigração sobre seu nome, respondeu como um bom europeu, pelo Sobrenome (Tabacow) e ai, seu pré-nome, numa corrupção, virou “Hidal”. Foi casado com Esther e teve 5 filhos, entre Eles, meu Tio-Avô Emílio, que foi o primeiro Hidal médico (eu sou a 3ª geração e minha Sobrinha Caroline é a 4ª) e meu avo Jacob.
g. Jacob Tabacow Hidal (1893-1952): Já nascido no Brasil era um comerciante de móveis, que quase faliu com a crise da bolsa de 1929. Foi casado com minha avó Fanny e tiveram apenas um filho, meu pai.
i. Meu pai contava que quando meu avô comprou seu primeiro carro, um Packard, a carta de motorista era entregue junto com o carro (não havia teste de proficiência).
ii. Próximo ao final da vida (morreu cedo do coração, como parece ser a sina dos Tabacow), seu médico lhe recomendou que parasse de trabalhar.
Como na época só havia uma modalidade de vinculo empregatício, com “Estabilidade no emprego”, ele gastou tudo o que havia ganho na vida, com as indenizações trabalhistas.
Para quem não sabe, este modelo de vinculo ainda existe, sendo que com a criação do FGTS, se criou uma opção de o empregado “Optar” pelo vinculo através deste Fundo.
2) Família Goldstein:
a. Se originam da Polônia, mas não tenho muito mais detalhes.
b. Meu Bisavô era Mayer Goldstein (1850-1932), que emigrou para o Brasil antes da virada do século, e era casado com Ana Mathilde, tiveram 5 filhos e minha avó Fanny a filha caçula, nasceu no Brasil.
i. Meyer trabalhava com alimentos (tipo secos e molhados)
ii. Morava na Região de Santo Amaro (que era um destino de muitos imigrantes e que durante 1838 a 1944 foi um Município independente de São Paulo.
iii. Quando da Construção da Represa de Guarapiranga (~1906) pelos canadenses da “Light” as terras dele foram inundadas e através de seu advogado (Otavio Mendes, quer era pai da futura Primeira Dama do Estado de SP, Leonor Mendes de Barros) ganhou uma vultuosa indenização e dizem que ficou rico
iv. Seus filhos no entanto, perderam este dinheiro
c. Minha Avó Fanny Goldstein Hidal (1893-1974): A única mulher da minha família que eu conheci que cozinhava direito
3) Casamento de meus avós Fanny e Jacob:
Não conheci meu Avô Jacob (faleceu em 1952, com cerca de 58 anos), mas minha avó Fanny contava que:
Ainda adolescente, num domingo, uma família amiga veio almoçar na casa de seus pais (meu Bisavô Mayer Goldstein) e quando saíram Mayer perguntou a ela: “Gostou do noivo”?
E foi assim que ela se casou com meu avô. Ela dizia que sabia que ela se casaria com quem o pai dela escolhesse e que este seria um bom noivo. Não sabia se seria alto ou baixo, magro ou gordo, mas sabia sim que o pai dela escolheria um bom noivo para ela.
Ela terminava esta história com uma frase que até hoje me incomoda, que era: “Vcs casam apaixonados e cada dia desconstroem o amor. Nós casávamos sem estar apaixonados, mas a cada dia construíamos mais amor”.
4) Esclarecimento:
Tanto Minha mãe quanto minha avó paterna se chamam Fanny (atenção não é costume dos Judeus Azhkenazi de dar o nome de uma pessoa viva a alguém) minha avó paterna se chamava Fanny Goldstein Hidal, e minha mãe que esta viva (pelo registro com 94 anos, mas deve ter 2 a 3 anos a mais) se chama Fanny Schechtman Tabacow Hidal.
Meu Avô Jacob tinha uma irmã (que me era muito querida) também chamada Fanny (parece que este nome faz sucesso na família)
5) Manoel, o nome:
a. Manoel não é um nome de origem portuguesa e sim bíblico (no Hebraico o nome correto é Emmanuel e significa: “D’us conosco)
b. Meu pai não gostava deste nome, tanto que a vida toda foi chamado de Hidal (qdo alguém me chama de Dr. Hidal, ainda acho que estão se referindo a meu pai) e aos 18 anos, tentou trocar de nome. Qdo esteve diante do Juiz, que poderia fazer sito,, este teria explicado: “O Sr. Pode trocar de nome, mas vão continuar lhe chamando de Manoel”.
II) Infância, e formação:
1) Nascimento:
a. Meu pai nasceu em São Paulo, em parto domiciliar (havia isto na época), na mesma casa e cama em que sua mãe havia nascido (a mobilidade não era tão grande assim). Se bem me lembro esta casa era na Rua Direita e minha avó e Bisavó criavam Gansos (isto mesmo, gansos na Rua Direita) de onde são as penas dos travesseiros que eu ainda tenho.
b) A comunidade judaica de SP naquela época era muito pequena (algo como 20 famílias) e para a cerimonia do “Brit-Milá” (circuncisão) de meu pai tiveram dificuldade de ter o “Minham” (quórum de 10 homens judeus adultos) e que o décimo teria sido meu bisavô Materno (Simpson Feffer, pai de minha avó Regina e de meus tios-avôs: Leon, Maria e David), que já estava por aqui na época. (minha Bisavó Berta, meus Avós: Regina e Moyses, e meus Tios-Avôs, Leon, Maria e David chegaram ao Brasil apenas em torno de 1919)
2) Meu pai foi filho único (nunca soube o porque, meus avós não tiveram mais filhos) e isto permitiu ao meu avô lhe proporcionar uma boa educação e se formar médico.
3) Se bem me lembro, meu pai estudava no Colégio Rio Branco, mas com o “crash” da Bolsa de Nova York em 1929, meu avô não pode mais pagar esta escola, e ele se transferiu para uma mais em conta (acho que era o Colégio Oswaldo Cruz). No Rio Branco meu pai tinha um colega, Otto Cyrilo Lehmann, que anos depois veio a ser nosso vizinho na Rua Tavares Cabral, depois Senador da republica e posteriormente meu paciente (nesta época, por volta de 2005 me contou varias estórias daquela época).
4) Bar Mitzvah
Para entenderem o sincretismo das práticas da época. Vejam estas fotos do Bar Mitzvah de meu pai (a festa foi no Sítio em São Miguel Paulista). Parece mais uma festa Junina, do que festa judaica.
5) Serviço Militar:
Ele prestou foi o “Tiro de Guerra”, que se entendi bem era uma forma em que se fazia exercícios militares e em finais de semana (tenham em conta que qdo ele completou 18 anos estávamos em 1933, logo após a Revolução Constitucionalista e possivelmente o Governo Federal não ia querer que SP tivesse um grande contingente militar).
Após fez um tal de “Pré-Médico” que, pela minha compreensão, seria um misto de complementação do Secundário (na época se chamava de Cientifico) com um Cursinho.
6) Formou-se na Escola Paulista de Medicina em 1942:
a. Alguns e seus colegas de classe eram: Carlos Alberto Salvatore (ainda vivo e meu paciente); Jorge Michalany; Salvador Julianelli; Henrique Paraventi; Domingos Defina
b. Durante sua época de EPM era Professor de Anatomia Patológica o Professor Walter Büngeler, que fora contratado na Alemanha (Danzig) e lecionou até cerca de 1942, qdo voltou para a Alemanha devido a convocação do Governo Nazista.
i. Vale a pena lembrar que em 1934 era Fundada a USP e para sua consolidação vários professores estrangeiros foram contratados, como Levi-Strauss e Hauptmann. Possivelmente a EPM, recém criada (em 1933) utilizou de estratégia semelhante
ii. Lembrem-se também dos recentes artigos que enviei sobre o envolvimento dos Médicos no Partido Nazista Alemão
c. Seus colegas me contavam que a região da Vila Clementino era quase abandonada, e que iam a pé a noite até a Av. Domingos de Moraes pegar o Bonde (para quem não sabe Bonde era uma forma de transporte publico, que ia em trilhos, como se fosse um Metrô de superfície. Seu nome vem da empresa que explorava este serviço que era: “São Paulo Tramway Bonds Company”, o nome “Bonds” indicava que era uma empresa de Ações, mas pegou como nome do meio de transporte).
7) Na época em que MTH se formou não havia Residência Médica (nem havia o Hospital São Paulo, e fez boa parte de sua formação na Santa Casa de SP). Ele queria fazer cirurgia geral, mas não havia vaga aberta para isto e acabou indo para a Urologia. Fez sua formação com nomes como os do Professores: Benedito Montenegro (que se não me falha a memoria foi o 1º Catedrático de Medicina da FMUSP); Darcy Villela Itiberê, que faleceu recentemente com cerca de 103 anos e era avô do Jair Ribeiro); Mammana.
8) Carros:
a. Sua Carta de Motorista:
i. Meu pai tirou sua primeira carta de motorista depois de formado em Medicina
ii. Para tirar a mesma era preciso provar que ele era alfabetizado a e forma de fazê-lo era através de um “ditado”.
Ele foi falar com o examinador, se não era possível ser dispensado do mesmo, pois ele era Médico e portanto alfabetizado
O Examinador, respondeu que era possível sim fazer um requerimento para dispensar do referido ditado, mas que era bem mais simples ele fazer o ditado.
b. Seu primeiro carro era um Vauxhall (fabrica inglesa que depois foi incorporada a General Motors), movido a gasogênio
i. Durante a 2ª Guerra Mundial havia uma carência de gasolina e uma das alternativas foi criar este sistema que gerava um gás combustível (vejam que a ideia de combustível alternatibo não é tão nova)
ii. Para saber mais vejam: https://pt.wikipedia.org/wiki/G%C3%A1s_de_s%C3%ADntese
III) Vida Profissional:
1) Vida Acadêmica:
a. Permaneceu como Assistente da EPM até os anos 50
b. Passou a trabalhar na Santa Casa (creio que com a inauguração do Hospital das Clinicas, houve um certo “esvaziamento” pois esta entidade era até então o “Hospital-Escola” da Faculdade de Medicina), onde permaneceu até o fim da vida.
i. Lembro de alguns nomes que eram sempre citados, como dos Professores: Emilio Athiê; Pedro Jabbur, Fares Rahal; Décio Len; Edwin Castelo, Filipozzi, Peretz Capelhuchnik; Julio Toporowski, entre tantos.
ii. Muitas vezes eu via meu pai estudando no escritório que tínhamos em casa e quando eu perguntava o porque ele dizia: “Amanhã eu tenho de discutir um caso com o Professor Oscar Monteiro de Barros” (interessante que na Escola Paulista de Medicina fui colega de um neto do Professor Oscar e minha mãe, que esta com 97 anos, só aceitou que eu virasse clinico e Endócrino, quando soube que eu ia trabalhar com o Rui Maciel, outro neto do Professor Oscar).
iii. Na Santa Casa, junto com o Professor Jabbur (nefrologista) começaram a fazer transplantes renais, e trouxeram esta técnica para o Hospital Einstein, sendo que no em torno de 1978 a 1979 os primeiros transplantes renais do HIAE foram feitos por eles (quando meu pai faleceu subitamente em agosto de 1979, um de seus pacientes internados era um transplantado).
iv. Hospital Santa Isabel: creio que na década de 70 é inaugurado este hospital, dentro do complexo da Santa Casa, para ser um Hospital particular
MTH lidera um grupo de professores que criam uma espécie de associação médica para gerar movimento para este hospital
A ideia parecia ser uma “win-win situation”, mas no final, foi que os já existentes pacientes destes Professores passaram a procura-los no Ambiente da Santa Casa em vez de ser nos seus consultórios.
Mas não foi bem sucedida, pois os mesmos pacientes daquelas mesmos médicos forma procurá-los neste Centro Médico
v. Das peculiaridades de um Judeu em um ambiente Católico:
Era um dos poucos homens que podia entrar na clausura para atender Freiras adoentadas
Em certa ocasião é sondado para ser Diretor da Faculdade de Medicina da Santa Casa, mas isto o impediria de ficar no Einstein
2) Serviço Publico:
a. Meu pai trabalhava no IAPI:
i. Para quem não sabe, antes do INAMPS ( e SUS), haviam os Institutos de Aposentadoria e Previdência de varias categorias profissionais, O IAPI era dos industriários, o IAPETC (?) era do comerciários e assim por diante.
ii. Após 1964 eles foram fundidos e deu origem ao INAMPS
b. Dirigiu Centros de Saúde (esta era a unidade que hoje conhecemos como UBS, onde se promovia saúde publica) da Capital e durante muitos anos foi Presidente de uma Associação dos Dirigentes de Centros de Saúde da Capital (lembro muito de um grande amigo de meu pai, Dr. Publio Dias, vindo em casa aos finais de semana e eles discutindo a saúde publica do Brasil).
c. Trabalhou na Secretaria de Saúde (me lembro de ir visita-lo no prédio da Av. São Luiz). Um dos episódios que me lembro ele relatar era:
Após a 2ª Guerra Mundial, a Alemanha vendeu Ambulâncias montadas em caminhões (que eram verdadeiros hospitais, para o Padrão da época) para conseguir algum dinheiro
A prefeitura de uma capital de nosso litoral comprou varias destas, para servirem como Hospitais volantes.
Quando elas chegaram, descobriram que as ruas eram muito estreitas e que as Ambulâncias não “cabiam” nas mesmas
Ele foi enviado para lá, para verificar se as mesmas serviriam para São Paulo (não perguntem, pois não sei a resposta, mas acredito que não serviam, pois nunca soube das mesmas aqui). Vejam o viés tecnológico que depois se manifestou no Einstein, já ocorria naquela época
d. Sociedade Brasileira de Urologia: Era um ativo participante e quando faleceu presidia a Regional de São Paulo.
3) Consultório Particular:
a. Em algum momento abre seu consultório, inicialmente na Rua Marconi e depois na Conselheiro Crispiniano (bem próximo ao Mappin)
i. Neste período não se edificava muito em SP (creio que pela 2ª Guerra havia escassez de materiais de construção e portanto havia uma enorme carência de locais para serem alugados). O Prédio do consultório da Conselheiro Crispiniano era propriedade da Irmandade da Santa Casa e de alguma forma, por lá trabalhar conseguiu fazer este aluguel.
ii. Foi neste consultório foi que um paciente dele, de Sobrenome Gordon, lhe relatou que sua Sobrinha, Sra. Ema G. Klabin, era responsável por um legado de seu falecido pai, para construir um Hospital Judaico em SP.
b. Anos depois mudou-se para a Marques de Itu, e apesar de ter comprado salas na recém inaugurada Faria Lima (há duas quadras de nossa residência) nunca quis se mudar para lá (tinha receio de que pela distancia abandonaria a Santa Casa)
IV) Vida Familiar e social:
1) O “Shiduch”: Meu Tio-Avô Materno, David Feffer (filho temporão de Simpson e Bertha, que morreu jovem de uma complicação de apendicite) fez a apresentação de meus pais em uma festa no Circulo Israelita (acho que na época já era na Av. Angélica), que anos depois se fundiu com o Macabi e virou o “Circulo Macabi”.
2) Se casaram em 1944 no Templo Beth El, com uma bela festa no Club Paulistano: Hoje (28/06/15) minha mãe me disse:
a. Que foram de Lua de Mel para Niterói (minha recordação teria sido em Petrópolis e teriam ido junto com um casal de amigos que se casou no mesmo dia, Anita e Mauricio Novinsky, sendo que a Anita muito anos depois veio a ser minha Professora, qdo cursei História na USP)
b. Foram morar numa edícula nos fundos da casa de meus avós maternos na Cardoso de Almeida.
c. Na época que o Eduardo nasceu (1951) já moravam na parte baixa da Rua Augusta
Era um prédio pequeno de 3 andares, sendo 2 por andar, morávamos no térreo, e era quase uma casa
O projeto era de Rino Levi (arquiteto Brasileiro que estudo em Milão e Roma, lá foi colega de Warchavsky), que depois ganhou o concurso para o primeiro prédio do Einstein (em um concurso organizado pelo Instituto dos Arquitetos)
Na época era considerado um projeto inovador, pois a área social separava os dormitórios da área de serviço.
d. Um pouco depois de eu nascer (1954) mudamos para a casa na R. Tavares Cabral (uma rua pequena que terminava na R. Iguatemy, Hoje Faria Lima e em cujo local, anos depois incorporamos um prédio que leva o nome de MTH).
Eu (nasci com o sorriso para baixo) com meus pais
Esta casa foi comprada de um Sr. Matoso (que era parente de Eusébio Matoso, o idealizador da Av. Rebouças)
Esta casa foi comprada a prazo, sendo que meu pai pagava diretamente ao Sr. Matoso as prestações
Após alguns anos, ainda havia um saldo significante a ser pago, quando numa mudança de legislação houve uma mudança de tributação e o Sr. Matoso pediu a meu pai para que a escritura definitiva fosse passada logo
Meu pai lhe explicou que não tinha dinheiro suficiente para quitar antecipadamente a divida
O Sr. Matoso lhe disse: Não estou lhe pedindo para antecipar a quitação, apenas para passar a escritura. Sei que o Sr. vai continuar pagando direitinho. Os tempos eram outros.
3) Animais:
a. Sempre tivemos bichos em casa, desde tartarugas, aquário (que era do meu gosto) e até Araras (que na verdade eram de um vizinho, mas adoravam ficar nas arvores de casa
b. Tivemos muitos cachorros e me lembro muito bem do:
Fu-Man-Chu, um pequinês que infelizmente morreu atropelado
Bobby, um Dachshund de pelo comprido (e rabo quebrado) que nos foi dado pelo saudoso Max Eberhardt
Quando a Alice e Max se mudaram de sua casa para um apartamento, o Bobby não se acostumou
O Bobby nunca me obedeceu, mas quando o Max vinha em casa e dava suas ordens em Alemão e fazia tudo direitinho
Winston e Margareth: Um casal de Buldogue Inglês que o Mauricio Tuck Schneider importou para ele
4) Atibaia:
a. Meus pai fizeram parte do núcleo inicial de condôminos da Estancia Parque Atibaia, que foi construído pelo Arão Sahm e Leon Feffer e lá passávamos férias e fins de semana prolongados.
b. Boa parte da Idealização do Einstein ocorreu lá e uma parte significante dos colaboradores iniciais do Einstein. Nos fins de semanas das férias havia sempre um “Grande Aperitivo”, onde a cada fim de semana uma família era responsável e nestes encontros intermináveis (pelo menos para as crianças) se delineava o que veio a ser o “Nosso Einstein”.
5) Hebraica aos domingos:
a. A Hebraica surge nos anos 50, e era bem menor que seu tamanho atual:
A entrada era em uma rotatória na Gabriel Monteiro da Silva, e na sua frente se alugava Cavalos para passear nos arredores que eram quase desertos
Havia um campo oficial de futebol
iii.
b. Outro cenário de “Planejamento Estratégico” do embrião do que veio a ser o Einstein ocorria aos Domingos na “A Hebraica” (na época era um clube novo, que como o Pinheiros [na época chamado de Germânia] se aproveitou de terrenos “conquistados” com a retificação do Rio Pinheiro), onde invariavelmente íamos e nunca conseguíamos sair, pois havia uma roda de pessoas em torno deste ideal, que para muitos, incluindo da nossa própria família, era um “Elefante Branco” (esta expressão vem do antigo Sião, onde um elefante Albino é um animal sagrado, e se o rei queria punir alguém dava de presente a ele um destes exemplares que precisava ser bem cuidado para todo o sempre), pois para um comunidade tão pequena por que se precisava de um Hospital tão grande, porque tão longe do Bom Retiro (ou do Higienópolis que começava a despontar como bairro judeu)
6) Férias:
a. Não se viajava com frequência para o exterior
b. Meu pai tinha um Chevrolet 1951 que durou muito tempo e muitos anos depois minha mãe comprou um Fusquinha (o dela ainda era alemão e para quem se lembra a seta de mudança de direção era uma espécie de “banana” que se levantava, com o Fusquinha me lembro de viagens memoráveis para:
Bahia
Brasília (onde conheci meu tio-avô Emílio)
Ouro Preto e demais cidades históricas (onde nos levaram em uma “Fabrica de Antiguidades”)
Foz do Iguaçu e Assunção do Paraguai (esta viagem foi inesquecível, pois foi durante esta que o homem chegou pela primeira vez a Lua)
Cambuquira (Sul de Minas Gerais):
Durante uma destas estadias, recebemos noticia que um primo meu (na época com cerca de 7 anos) teve uma hemorragia cerebral, por ruptura de aneurisma
Em plena madrugada, no nosso fusquinha, numa chuva torrencial pegamos a estrada para voltar a São Paulo. Meu pai parou para abastecer o carro e o Frentista perguntou a ele: o Sr. Precisa de balas para o seu revolver?
7) Lazer: meu pai trabalhava muito e muitas vezes para falar com ele eu tinha de vir ao Einstein, as além de ser um excelente papo, com inúmeras histórias e estórias (traço que possivelmente herdei), ele tinha um prazer em:
a. Assar churrascos: Tendo até desenvolvido um espeto especial, mas esta fase terminou qdo ele teve, ao que me parece, uma forte infecção pulmonar (de tanto ficar no calor da churrasqueira).
b. Dançar: Outros amigos referiam que meu pai era um “pé-de-valsa”, termo que se aplicava a quem gostava muito de dançar (este atributo eu não herdei) e que era um “puxador” de carnaval, coisa que eu nem consigo imaginar, mas eu me lembro muito bem de eu ir, e gostar muito, a o Carnaval de salão de clubes (como a Hebraica) onde eu tinha uma fantasia de Pierrô.
c. Juscelino: Meu pai era um fanático por Juscelino Kubitschek (quem sabe por este tb ser Urologista) e qdo Brasília foi inaugurada ele e mais alguns amigos (incluindo o Marco Elisabetsky, cuja neta um de meus filhos namora) foram para Brasília de fusquinha para esta cerimonia. Ele era tão empolgado com isto que comprou na época um “Apartamento-Funcional” que era uma moradia para os funcionários que iriam morar em Brasília (anos depois deu um trabalhão para vender).
8) Amigos: Pelos vários chapéus que ele vestiu ao longo da sua vida ele tinha amizade, simpatia por pessoas das mais variadas. Não quero fazer lista, pois seguramente vou esquecer de muitos, mas não posso deixar de comentar alguns nomes em especial:
a. Alice e Max Eberhardt: que cuidaram de nossa família como verdadeiros pais, depois do falecimento de meu pai
b. Esther e Arnaldo Mindlin: Primos de meu pai, que foram melhores amigos
c. Anita e José Goldberg: Idem (Anita e Esther eram filhas de Sarah e Samuel, ela irmã de minha avó Fanny que tiveram 8 filhos. Meu pai, filho único foi criado com estes 8 primos)
9) Afilhado e Padrinho:
a. No Judaísmo a pessoa que segura o Recém-nascido na sua Circuncisão é o Sendak, que significa Padrinho
b. Não tem o mesmo significado que no Catolicismo
c. Os padrinhos de meu pai eram Golde e Jacob Nebel, pelos quais ele nutria uma verdadeira paixão e devoção (quero crer que este deveriam trata-lo de forma especial)
d. Quem sabe pela forma como foi cuidado, aceitou ser Padrinho de apenas uma criança na vida, que é o meu primo Mauro Rabinovitch, que sempre o chamava carinhosamente “Tio-Padrinho”. Havia entre eles uma relação especial que nunca mais vi em um “Padrinho – Afilhado”.
V) Judaísmo: Creio que por ser de uma família de imigração bastante antiga e por haverem poucas famílias judias em SP, não foi fácil se manter no judaísmo>
a. Uma das irmãs de minha Avó Fanny, Vera (1889 – 1933), se casou com Julio Contier, não judeu e foi uma verdadeira comoção na família (no melhor da tradição judaica, dizem que Mayer, seu pai, nunca mais falou com a filha.
b. Acredito que o judaísmo da família não era muito grande.
c. Meu pai mal sabia reconhecer as letras do alfabeto hebraico.
d. Bar Mitzva de meu pai (comemorado em Junho de 1928) foi uma festa junina (ou como dizem os entendidos Joanina) e o álbum de fotos, mostra fogueira, quermesse, Pau de sebo, etc. Isto é havia um sincretismo religioso total.
e) No entanto Fanny e Manoel deram ao meu irmão Eduardo e a mim uma formação judaica muito maior do que a que tiveram. Nos ensinaram que dos 613 mandamentos bíblicos que um judeu deve seguir, os que efetivamente valem são os éticos e que os de costume são de menor importância.
f) Um dos episódios interessantes desta época: Receber ou não receber dinheiro da Alemanha?
i) A época da epopeia da construção do Einstein é bem próxima do final da 2ª Guerra e muitas das atrocidades são reveladas nesta época (Eichmann em Jerusalém ocorre em 1962)
ii) Vários amigos e colaboradores do Einstein tinham sofrido muito na Alemanha e não admitiam nenhum contato com nada que tivesse relação com este pais (não tomavam vinho alemão, não andavam em carro alemão, etc.)
iii) As vésperas da inauguração do HIAE (1972) não tinham dinheiro para comprar o material cirúrgico
iv) Nisto surge uma generosa contribuição da Central Evangélica de Bonn (na época Berlin era dividida e não era a Capital)
v) Surge o dilema na Diretoria: Receber ou não dinheiro da Alemanha. Meu pai escreve para o Sr. Nahum Goldman (Presidente do Conselho Mundial Judaico) perguntando o que fazer. Este responde (eu ainda tenho a carta), que se Israel pode receber dinheiro da Alemanha, o Einstein tb poderia fazê-lo. Versão moderna do “Pecunia non olet” do Imperador Vespasiano.
VI Coisas que não deram certo:
a) ONISA (?): Junto com alguns amigos (médicos e não médicos) tentaram constituir uma incorporadora imobiliária, mas esta deu em nada
b) Sitio em São Miguel Paulista:
Meu avô Jacob tinha uma bela propriedade nesta cidade (eu tenho vaga memória da mesma)
As pessoas que frequentavam comentavam sobre como era divertido
Foi invadida por grileiros (~ década de 60) e MTH não conseguiu (ou não soube) lidar com isto. Acabou se desfazendo por uma fração de seu verdadeiro valor
c) Aposentadoria:
a. Por mais que tentasse meu pai nunca conseguiu se aposentar do Serviço publico, a exigência de documentos (como por exemplo: ele precisava apresentar copias de certificados de óbito que ele tenha emitido, para comprovar que ele efetivamente praticava a medicina).
b. De qq modo, qdo em 1889 Bismarck inventou, na Alemanha, a aposentadoria, a idade para alcança-la era de 70 anos, acima da expectativa de vida da época (isto é, já não era para dar certo).
VI) A saúde:
a) Sempre aprendi que os Tabacow morriam cedo do coração (e por isto trato agressivamente meu colesterol deste o surgimento da primeira estatina na década de 70)
Vide a história de meu Avô e Bisavô
Adolpho Tabacow, o pianista (não sei qual o parentesco real) tb morreu cedo do coração
Minha mãe diz que ele sempre soube que teria um problema cardíaco
A primeira vez que vi meu pai doente, foi qdo teve uma fratura na perna e precisou ficar acamado.
Minha mãe estava na Europa
Meu Tio-Avô Leon Feffer, vinha quase todos os finais de tarde para fazer companhia
b) Quando fiz meu vestibular para a EPM (1972) meu pai teve algum problema cardíaco:
Como não sabia como lidar com a situação tinha dois cardiologistas: Drs. Feher e Schubsky.
Precisou fazer um cateterismo cardíaco, sendo que na época não havia este serviço no Einstein e foi fazê-lo na Antiga Gastro-clinica (hoje Edmundo Vasconcellos) com o Dr. Paulo Paulista.
Haviam inúmeras obstruções e coronárias e para a tecnologia da época (só havia cirurgia, não existia angioplastia) não havia muito a ser feito.
c) Na véspera dos dias dos pais de 1979 ele teve um Edema Agudo de Pulmão em nossa residência. Infelizmente a Ambulância do Einstein chegou tarde, ele já tinha falecido. Ironia: Idealizou e construiu um Hospital, mas faleceu em casa
Epilogo: Uma das 8 primas de meu pai, a Esther Mindlin, esta com 99 anos e ainda me conta histórias da época em que eram jovens
Peço perdão por um texto tão longo, mas tenham certeza que não será repetido tão cedo.
Obrigado pela paciência
Jairo
Jairo. Muito linda essa biografia. Acho que dos atuais grupos sou um dos poucos que não só conheci sua mãe e seus ensinamentos, como também provei seus deliciosos jantares , em companhia tão agradável como a sua e do Daniel Muito obrigado por ter tido essa rara oportunidade
Nelio querido, nada como ter amigos, com quem a gente possa compartilhar as experiencias da vida
Jairo, sou a Célia RUBINSTEIN Eisenbaum. Sua prima, filha da Fanny , irmã do seu avô. Temos muito a conversar, trocar ” figurinhas”… Agora sou cliente da Luci. Adorável pessoa e não atoa a procurei como médica. O espaço é pequeno para o muito que temos a conversar. Parabéns pelo “texto-memória” e até breve… assim espero.
Celia querida,
Lógico que sei quem vc é (a Luci inclusive me falou de sua vinda aqui). Vamos sim nos ver e por em dia as conversas
E eu sou o Leopoldo, neto da Rosa, também irmã de sua avó.
Eu e a Célia nos vemos com frequência.
Leopoldo,
Muito obrigado pro se comunicar comigo. Fico muito feliz de encontrar mais um “primo”
Boa noite! Fiquei impactada com o relato de uma vida tão fecunda, e que ainda hoje produz frutos!a
Obrigado!
Sonhei com seu pai esta noite, sem saber quem era fui em busca, como não conhecia fui procurar saber quem era, pois o sonho foi muito real, até o detalhe dps cachorros se confirmou! E me deparei com tal vida que gerou tantas vidas, e quem nem sabem, mas ainda gera!! Obrigado!
Rosimeire,
Eu que agradeço a sua generosidade
jairo
Olá
Sou bisneta de Mayer Goldstein
Neta de Jacob Goldstein
Filha de Marcos Goldstein, primo de Manoel Hidal
Muito bom saber as raízes da nossa família
Cara prima vera,
Que bom ter noticias suas e estabelecer este contato.
Minha avó Fanny (irmã do seu avo Jacob) contava histórias da familia.
Vamos manter o contato
jairo
Que texto encantador, uma delícia de leitura.
Olá, Jairo.
Lindo texto! Minha bisavó, Vera Goldstein, era irmã de Fanny. Gostaria muito de resgatar um pouco da história da família. Infelizmente, meu pai e tias faleceram. Minha tia Inês me contou um pouco sobre a minha bisavó. Se tiver alguma foto, história para me contar, agradeceria muito.
Um grande abraço,
Ana Teresa Contier