Queridos amigos,

Desde pequeno eu me questiono sobre o que é celebrado no ano novo (do nosso calendário Gregoriano). O que esta data tem de especial e o que muda do dia 31 de Dezembro para o dia 1º de janeiro?

Em muitas religiões esta celebração tem um significado especial, como no Islamismo, que se comemora a migração do Profeta Maomé de Meca para Medina, no Calendário Chinês, onde se honra os antepassados e Divindades e no Judaísmo (Rosh Hashana) o aniversario da Criação do Mundo e o surgimento da humanidade (é o 6º dia da criação). Nos três exemplos acima (Islã, Chinês e judaico) os calendários são lunares e as datas de suas celebrações não coincidem com as do nosso calendário. Estas celebrações foram estabelecidas no hemisfério norte e suas datas em geral coincidem com o começo ou fim de uma estação climática (lembrar que sobreviver ao inverno neste local, naquela época não era fácil e, portanto deveria ter muito a ser celebrado).

Na antiga Mesopotâmia o ano novo era celebrado numa festival de 12 dias que ocorria no equinócio da primavera. Os gregos faziam sua festa no Solstício de inverno, e em Roma o ano novo era celebrado em Março, porem em 46 AC este calendário foi modificado, dois meses foram adicionados (Julio: em homenagem a Julio Cesar e Agosto em homenagem a Augusto, e como curiosidade para quem não percebeu o sétimo mês [Septembro] passou a ser o 9º mês, o oitavo mês (octubro) passou a ser o 10º mês e assim por diante) e a data do ano novo passou a ser dia 1º de janeiro. Na era Cristã, como em tantas outras datas de celebrações pagãs, as datas foram aproveitadas e “transmutadas” para a nova fé.

Mas volto a minha duvida antiga, o que será diferente 1 segundo após a meia noite da 2ª feira dia 31 de Dezembro, que não deveria ter significado algum, mas de alguma maneira nós achamos que este “Tic-Tac” do relógio é diferente dos demais. Deixamos nossas atividades cotidianas, nos reunimos com pessoas queridas, refletimos sobre o passado, fazemos promessas para o futuro. Possivelmente em nenhum outro momento do calendário agimos assim.

Se esta celebração se perdura por milênios e esta espalhada por diversas civilizações (desde uma época sem globalização) deve haver alguma razão atávica, impregnada em nossos instintos animais básicos, algo de significância e profundidade, caso contrario, não investiríamos tanta energia e recursos só para uma simples festividade. Porque nesta comemoração nos propomos a dar um “Novo Começo”, com uma série de novas promessas (que sabemos que não vamos cumprir)? Possivelmente este ato simbólico esteja enraizado numa de nossas mais poderosas forças de motivação: “Nosso Instinto de Sobrevivência”.

A parte de celebração é quase obvia, é como nosso aniversario: “mais um ano se passou”. Sobrevivemos, mas porque fazemos promessas e resoluções de ano novo. Devem existir muitas razões, mas seguramente o desejo de “Controlar Nossos Destinos” deve ser uma delas (e bem importante). O futuro nos é desconhecido (vela a pena citar a frase do famoso jogador de Basebol americano, Yogi Berra: “The Future is not what it used to be”) e nos amedronta, pois não sabemos como nos preparar para ele (deve ser por isto que a maior parte de nós vai se tornando mais “conservadora” com o envelhecer). Uma das estratégias para combater esta impotência, fazemos coisas para ter “controle”. Resolvemos que vamos fazer exercício, dieta, parar de fumar. Nem interessa muito se vamos conseguir cumprir o trato ou não. Se comprometer a realiza-las nos da uma sensação de poder (mesmo que seja por um breve instante) sobre o futuro incerto.

Resoluções de ano novo incluem coisas variadas, como pagar dividas, fazer novos amigos (eu na Sinagoga, qdo toca o Shofar, peço a D’us, saúde para a minha família, Paz no mundo e em Israel e para mim que eu tenha mais paciência e melhor humor. Aprendi que nãos e deve pedir nada de pessoal ao Criador). Na Babilônia se devolviam objetos que foram emprestados, os Judeus buscam e oferecem perdão, os Escoceses fazem o “first footing” (visitar os vizinhos para lhes oferecem bons votos). Porque fazemos isto? Porque somos “animais sociais”, pois dependemos uns dos outros para nossa saúde e segurança. Tratar bem aos outros é uma boa maneira de vir a ser bem tratado.

Muitas pessoas optam por rezar mais, o que também faz sentido em uma busca de sobrevivência. Embora todos nós um dia vamos morrer, durante o milênios a humanidade lidou (e lida) com o medo da morte através de ligações religiosas, que prometem um “Final Feliz”. Um parente próximo meu era bastante religioso (mas não muito cumpridor dos mandamentos bíblicos) e ele tinha um medo enorme de morrer. Na minha interpretação, ele esta com medo de encontrar o Criador e ter sua punição.

Existem vários rituais de boa sorte relacionados ao ano novo (em casa, num sincretismo religioso a toda prova, vestimos branco, pulamos sete ondas em Paraty e cada um de nós escreve três desejos [não pessoais] e coloca num balão de gás hélio. O balão de cada um é amarrado ao balão dos outros, de modo que o “Seu” desejo faz com que o “Meu” desejo suba mais alto [uma vez em Eilat, Israel a família do Amancio e minha fez isto e os balões acabaram na Arábia Saudita, sei não se foi uma boa estratégia]). Na Holanda, onde o circulo é um símbolo de sucesso se come Donuts. Na Grécia se come um bolo especial “Vassilopitta” que tem uma moeda de boa sorte dentro. Os fogos de artificio começaram a mais de um milênio na China como forma de espantar os maus espíritos (alias o habito de se “bater na madeira” vem da mesma superstição).

Desentendimentos e querelas entre pessoas devem ser resolvidas e postas de lado, e um “Novo Começo” se estabelece. Em varias culturas se varrem as casas, para tirar as “Bad Vibes” e fazer espaço para vibrações melhores (obvio que tb tb serve de razão de limpar as casas, que não deveria ser algo muito comum na antiguidade. Alias o ritual na pascoa judaica de se retirar todo o fermento da casa, deve ser um “Spring Cleaning”.

Para mim estes rituais são parecidos a “Confort Food”, me dão um acolhimento, uma sensação de pertencer e de identidade, me faz muito bem. Vou fazer promessas (que todos já sabem que não vou cumprir), vou pedir Paz, saúde e que eu tenha muito mais paciência com as pessoas. Peço perdão a todos que magoei e apesar de não se lembrar de nenhuma ofensa feita a mim todos estão perdoados. De verdade mesmo, o que eu quero mesmo neste ano, é a oportunidade de ver mais as pessoas que gosto e poder compartilhar com todos esta maravilhosa experiência que é a vida.

Martin Buber Filosofo Judeu Alemão da primeira metade do século XX (ele se mudou para a Palestina antes da fundação do Estado de Israel e advertia que se aquilo não daria certo se não fosse encontrada uma solução para o Povo Palestino) escreveu (não me lembro literalmente): “Numa certa idade descobri que eu tive melhores experiências com os livros do que com as pessoas, e passei a preferir a ficar com os livros. Com o passar dos anos, descobri que as más experiências com as pessoas me enriqueceram mais do que as boas experiências com os livros. Assim se hoje leio um livro, faço-o porque posso lê-lo diante de um homem”. Assim, eu um confesso “rato de biblioteca”, desejo a vcs (alguns só de relações epistolares) um feliz ano novo, cheio de realizações e alegrias e não se sintam culpados por não terem cumprido as promessas realizadas. Elas existem para nãos erem cumpridas.

Desejo a todos, um Feliz Natal e um prospero ano novo.

Bs

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