Meu texto de fim de ano: 27/12/20

Disclaimer”: Nestes meus textos eu escrevo algumas coisas sobre religião e em especial sobre Judaísmo, no entanto eu preciso deixar bem claro: não tenho formação religiosa.  Me auto intitulo como sendo um “judeu cultural” e seguramente existem pessoas mais doutas que eu.

O Livro de Jó é um dos textos do Antigo Testamento e explica o conceito da “Teodiceia”, que é como D’us permite que o “mal” exista no mundo e o porque coisas ruins ocorrem para pessoas boas. https://en.wikipedia.org/wiki/Book_of_Job

O livro acima foi escrito por um Rabino americano, que teve um filho com Progéria (doença genética, com envelhecimento acelerado, em que o óbito inexoravelmente ocorre antes dos 14 anos) e ele se pergunta do porquê isto teria ocorrido com ele, que cumpre com todos os mandamentos bíblicos? O Rabino descreve as explicações possíveis, pelo seu viés de homem religioso.

Obviamente que coloco está assunto devido a Pandemia e suas consequências para todos nós.

Cuidei de mais de 300 casos de COVID-19, sem nenhum óbito.

No entanto, nos últimos 10 anos tive a oportunidade ajudar nos cuidados de saúde do Lama Tibetano Gangchen Rinpoche, que morava na Itália, onde acabou pegando o COVID-19. Como um Bodhisatva (um ser Iluminado) chamou a si os males desta doença e o seu corpo físico não suportou. Vejam no meu Blog: https://mostlykind.com/lama-gangchen-rinponche-1941-2020-lama-shresta-thinle-yarpel/

Pelas minhas leituras em vários períodos trágicos (guerras, pestes, perseguições, escravidão, cataclismas etc.) da humanidade muitos devem ter se perguntado onde está D’us neste momento. Cada um de acordo com os seus valores, sua criação e educação tem sua própria percepção de um “Criador”.

Me encanto com a filosofia de Espinoza (judeu Holandês, cuja família teve de fugir de Portugal e foi excomungado por seus pensamentos) https://pt.wikipedia.org/wiki/Baruch_Espinoza

Naquilo que entendo como o D’us (algumas pessoas me perguntam por que escrevo desta forma. Explico: Para pessoas muito religiosas, não se deve escrever ou proferir o Nome do Criador em vão) de Espinoza ele não seria um Legislador, nem um Ditador e menos ainda um Soberano sentado em um trono mandando e desmandando, escolhendo quem vai para o céu e quem é condenado ao Inferno. Para Espinoza, D’us é a própria natureza. D’us é todas as coisas e não existe nada fora dele.

No seu “Tratado Teológico Político” Espinoza alerta para os perigos da religião organizada, que começa oferecendo explicações do mundo, mas que termina impondo sua fé e forçando os outros a obedecerem ao que suas crenças mandam. Segundo Espinoza, D’us não quer obediência simplesmente porque é impossível desobedecê-lo, pois Ele é a Natureza e suas leis seguem a sua própria essência.

Segundo Espinoza tudo o que fazemos se reflete em nossos pensamentos e tudo que pensamos se reflete em nosso corpo, não há uma relação de hierarquia, os dois são a mesma coisa. Para se pensar corretamente é preciso viver corretamente e o contrário também é verdade: para se viver corretamente é preciso pensar corretamente.

Um dos meus “heróis” é R. Buckminster Fuller:

https://en.wikipedia.org/wiki/Buckminster_Fuller que foi um arquiteto americano, que entre outras coisas criou o domo geodésico. Ele criou na década de 1960 o conceito de que a Terra é uma espécie de Espaçonave em uma viagem a um destino muito longínquo, com suprimentos limitados. Se soubermos utilizá-los adequadamente vamos poder chegar ao nosso destino. No entanto ele mesmo colocou o problema que tínhamos:  “The Main issue with Spaceship Earth is that an Instruction Manual, didn’t come with it”  Obviamente que ele escreveu este manual: https://www.lars-mueller-publishers.com/operating-manual-spaceship-earth  

Uma das minhas características (que em certas situações pode ser uma qualidade, mas em outras um defeito) é o meu “Decision Making Process”. Sou bastante indeciso e para eu poder resolver as minhas muitas dúvidas, desenvolvi uma estratégia de estudar. Tento avaliar os problemas por várias perspectivas.

No entanto, percebo que certas pessoas têm além de uma capacidade de decisão muito mais “straightforward”, tem o que eu chamo de “Gene do Dogmatismo”, que se demonstra em um quase fanatismo em certos campos. Até recentemente eu achava que isto se manifestava em três campos das atividades:

1. No Futebol: onde as pessoas podem ir as “vias de fato” para impor sua versão
2. Na Religião: com todos os “Savonarolas” de plantão
3. Na Política: Quem não teve uma situação uma situação de grande cizânia entre familiares ou amigos na última eleição Presidencial.

Com o COVID-19 descobri um quarto campo onde este Dogmatismo se expressa: NA SAÚDE. Parecido com final de Copa do Mundo, de repetente se descobre que temos mais de 200 milhões de especialistas em doenças, cada um com sua receita infalível, que defende com “unhas e dentes”. E eu, com este meu processo de decisão atrapalhado, tenho de me basear na ciência e não nos “achismos”.

Pessoalmente não acho que as pessoas vão mudar (de verdade) no pós-pandemia (vejam o que está ocorrendo neste final de ano), mas eu espero que EU PESSOALMENTE mude. Tentarei explicar:

1. Tenho 66 anos de idade, consegui alcançar quase tudo que me propus nesta vida (e o pouco que não consegui, no fundo não eram tão importantes para a minha felicidade pessoal).
2.  Já ultrapassei a idade com que meus avós e pai faleceram.
3. Vi um filho se casar (um pouco peculiar “casamento na Pandemia” transmitido por Zoom), o que meu pai não vivenciou.
4. Sou casado, há quase 35 anos, com a “Paixão da Minha Vida” e nos revelamos excelentes companheiros neste período de semi-reclusão (somos muito boa companhia um para o outro)
5. Tenho uma Nora e dois filhos, que em várias coisas são diferentes do que eu sou, mas que me complementam de forma maravilhosa, me mostram caminhos e perspectivas que me ajudam a ser um pouco melhor.
6. Sem ser pretencioso, nem arrogante, creio ter um número surpreendente de bons amigos, que me aceitam como eu sou (e com todas as patacoadas que eu faço habitualmente)

Entretanto, creio que a Pandemia revelou muito sobre a personalidade e o caráter das pessoas, em especial quem se preocupa verdadeiramente com os outros.  Me esforço para não julgar as pessoas e suas atitudes, mas tenho o direito de decidir com quem quero fazer o restante da jornada que ainda me resta.

Se eu tiver escolha, gostaria que no futuro eu possa:

1. Estar mais tempo com minha familia
2. Conviver com pessoas generosas, mas não das que exercem uma “generosidade financeira”, mas sim daquelas que aloquem uma das coisas mais preciosas que cada um tem: SEU TEMPO
3. Ajudar nos cuidados de saúde a pessoas que verdadeiramente queiram se cuidar
4. Continuar a poder viajar para os locais esquisitos que eu tanto gosto.
   1.  Creio que vcs conhecem uma das frases que em definem: “O que me limita viajar são duas coisas: Joelho e Dinheiro”. Explico:
      1. Quando eu tinha joelhos eu não tinha dinheiro
      1. Agora que tenho algum dinheiro, me falham os joelhos (atenção: ainda da para muita coiisas)
   1.  Alguns exemplos destes destinos
      1. Salar de Uyuni  (tenho uma viagem paga, que não realizei devido a Pandemia)
      1. Bessarabia e Ucrânia (de onde vem as famílias da Luci e minha)
      1. Trem Transiberiano
      1. Gorilas em Rwanda
      1. Madagascar
5. Que eu consiga ser mais tolerante e menos irritadiço (alias é a única coisa que eu peço para mim mesmo em Rosh Hashana e Yom Kypur)

Assim parafraseando Nietzche: “O que não me mata, me fortalece”. Temos de sair desta vivência, melhores e mais fortes

Assim independentemente de qual seja sua formação cultural e religiosa, suas origens e seus valores, espero que cada um (e todos coletivamente) saiam desta pandemia melhores do que entraram

jairo