Antes de começar este texto quero deixar claro que apenas expresso minhas opiniões pessoais. Venho de uma família que pratica um judaísmo liberal e sou um auto-didata. Seguramente muita gente discordará do que escrevo e conheço pessoas com formação muito mais erudita do que eu, que vale a pena ser consultada.
Nós Judeus compomos cerca de 0,2% da população Mundial e estamos por aqui a milênios, mesmo com todas as perseguições e tragédias.
O Judaísmo é possivelmente a primeira religião monoteísta a surgir e não é proselitista, isto é não busca conversos. Possivelmente este povo tenha criado o que chamo de o “Primeiro D’us Móvel”. Explico. Na antiguidade, o costume era cada local ter o seu D’us próprio e que era cultuado neste local, assim, imagine que:
- Se você fosse visitar alguém de uma terra distinta da sua, o esperado é que você cultuasse a divindade de seu anfitrião.
- Neste conceito de “D’us Móvel”, você vai a casa de outro e quer cultuar o seu D’us próprio e se seu anfitrião também quiser fazer, você responde que ele não pode, pois não é (e nem poderá ser) membro desta “Tribo”. Receita para confusão.
O que significa ser o “Povo Escolhido”?
Todos já devem ter escutado que os Judeus se auto-intitulam como sendo o “Povo Escolhido”.
- Isto pode levar a um falso conceito de que os Judeus seriam os “queridinhos” de D’us, o que não é verdade.
- A “Escolha”é na verdade para cumprir uma tarefa, que são os 613 Mandamentos (não são só 10) que D’us deu ao Judeus no Monte Sinai, após a fuga do Egito.
- Se TODOS os Judeus cumprirem TODOS os Mandamentos, o Messias (em hebraico: Maschiach e em Grego: Cristo) virá e as profecias serão concretizadas.
Quem esta “preso”a esta obrigação são os descendentes daqueles que estavam no Monte Sinai (isto é, se seu antepassado não estava lá, não adianta vc se juntar a causa), e é por isto que a conversão não é estimulada, pois não ajuda muito a “causa da vinda do Messias” alguém que não esta preso a esta obrigação.
O começo – Os Hebreus
Abraão (em hebraico: Avraham Avinu – Abraão Nosso Pai) nasceu e viveu em Ur na Caldéia, região da Mesopotania (onde hoje se situa o Iraque) em cerca do 20 Século AC.
Segundo o Livro de Gênesis, quando tinha cerca de 75 anos, Abraham recebeu um chamamento Divino para viajar para uma terra distinta onde seria recompensado de maneira inimaginável. Genesis 12:2-3.
“Farei de você um grande povo, e o abençoarei. Tornarei famoso o seu nome, e você será uma bênção.
Abençoarei os que o abençoarem, e amaldiçoarei os que o amaldiçoarem; e por meio de você todos os povos da terra serão abençoados”.
Quando chegaram a Canaan, segundo Genesis 12:7 D’us disse:
“À sua descendência darei esta terra”. Abraão construiu ali um altar dedicado ao Senhor, que lhe havia aparecido.
Este povo passou a ser conhecido como HEBREUS e existem algumas possíveis explicações para a origem deste nome:
- Um dos filhos de Noé (o do diluvio) é Shem (de onde descendem os povos semíticos (incluindo os muçulmanos e os judeus). Um de seus filhos é Eber, que poderia ser a raiz de onde o nome do povo é dado.
- Abraão veio do “outro lado do rio”(Eufrates) e em hebraico se chama me’ever
O nome do Club A Hebraica vem dai.
No meio do caminho: OS ISRAELITAS:
Jacob, o terceiro Patriarca, sai da Terra de Canaan (pois foi ameaçado de Morte por seu irmão Esaú, após lhe ter ludibriado com o direito de primogenitude) e mora por muitos anos com Labão (irmão de sua mãe Rebeca), onde se casa com suas duas filhas Lea e Rachel. Após muitos anos D’us ordena que ele retorne a casa de seus pais (Genesis 32:9)
No entanto Jacob estava temeroso de seu re-encontro com Esaú.
Quando estava para cruzar o Rio Jordão, Jacob ora a D’us e diz (Genesis 32:12):
Pois tu prometeste: ‘Esteja certo de que eu o farei prosperar e farei os seus descendentes tão numerosos como a areia do mar, que não se pode contar’ “
Enquanto Jacob estava sozinho, em comunhão com D’us surge um ser misterioso (alguns dizem ser um Anjo, outros, o próprio D’us) e os dois entraram em uma briga corporal até o raiar do dia, sem vencedores. O Anjo deslocou a coxa de Jacob e mesmo assim não conseguiu derrotá-lo (esta é a razão pela qual nos preceitos dietéticos judaicos não se deve comer um bom Filé Mignon, pois não se deve comer carne que contenha um tendão, ou nervo ciático).
Jacob só aceita deixar o Anjo partir se receber uma benção e em Genesis 32:28 esta escrito:
Então disse: Não te chamarás mais Jacó, mas Israel (aquele que luta com D’us); pois como príncipe lutaste com Deus e com os homens, e prevaleceste.
Desta ocasião vem o nome Israelita, que é muito usada para definir este povo, por exemplo, existem várias entidades que levam este nome, por exemplo:
- Confederação Israelita do Brasil
- Congregação Israelita Paulista
- Hospital Israelita Albert Einstein
O termo Israelita (que se refere a uma religião) causa muita confusão com o termo Israelense (que é uma nacionalidade). Eu sou um Israelita (ou Judeu) Brasileiro, mas não sou Israelense.
Finalmente chegamos aos JUDEUS:
Muitas gerações se passam, os 12 filhos de Jacob vão para o Egito (devido aos 7 anos de vacas magras), acabam sendo escravizados e finalmente Moises (aproximadamente em 1.200 AC) os libera e retornam a Canaan.
Cada uma das 12 tribos se fixou em uma determinada região, como se fossem estados, onde cada uma se especializou em trabalhos diferentes. Uma destas tribos dos Levi (que tem um papel especifico de ajudar nos serviços religiosos, estava distribuída pelas demais 11 tribos, isto é, não tinha seu próprio território).
Após a morte do Rei Salomão, em 930 AC, o Reino foi dividido e dois (que ficaram bem mais fracos), sendo que ao Norte ficaram 10 tribos e se chamava Israel, ao Sul ficou a Tribo de Judá (Judá é o nome de um dos 12 filhos de Jacob) onde ficava Jerusalém (é meio confuso, pois a Israel de hoje ocupa os territórios dos antigos Reinos de Judá e de Israel)
Em 722 AC os Assírios conquistam e destroem o Reino do Norte e entre suas praticas estava a dispersão dos povos conquistados, a fim de evitar rebeliões. As 10 tribos (conhecidas até hoje como as Dez Tribos Perdidas) foram re-alocadas pelo Império e uma população de origem Assíria foi trazida para ocupar este Terra.
Nos Estados Unidos é mais comum se referir a entidades da comunidade como “Jewish” (Judaicas), por exemplo: National Jewish Health (o principal Centro de Doenças Respiratórias daquele país) https://www.nationaljewish.org/home; ou a United Jewish Appeal (a principal entidade arrecadadora de fundos dos EUA) https://ajhs.org/uja
Quem são os Judeus atuais?
Das Doze Tribos dos descendentes de Jacob, hoje sobraram duas (e sua denominação passa de pai para filho, como uma forma de Casta). Se calcula que existem menos do que 14 Milhões de Judeus no mundo e mesmo 75 anos após o final da 2a Guerra Mundial, ainda não se conseguiu repor a população perdida (dos 10 Milhões de Judeus existente na Europa em 1933, 60% foram mortos pelos Nazistas). Só como referência se estima que no Século XI, os Judeus eram 3% da população mundial
- Tribo de Judá:
- É o meu caso e da maioria dos membros desta comunidade.
- Somos o “Povão”
- Mas temos um privilégio: o Messias é, será, ou foi membro desta Tribo
- Tribo de Levi:
- Se vocês se lembram os Membros desta Tribo não tinham um território próprio
- Ajudavam os Sacerdotes nas tarefas religiosas, e portanto precisavam estar espalhados com os demais.
- Se estima que 4% dos Judeus atuais pertençam a esta Tribo.
- Muita gente que tem este sobrenome, ou algo assemelhado é desta Tribo, exemplos: Levy; Levi; Lewin; Levinson, etc. (por exemplo em algum momento a família do ex-Ministro Joaquim Levi foi judia e eram desta Tribo).
- Há uma Casta Especial: Os Cohen (em Português Sacerdotes):
- Estima-se que sejam ~1,5% dos atuais Judeus
- Eles são descendentes de Aaron (irmão de Moises), que era da Tribo de Levi (não são uma Tribo por si só). Estes passaram a ter as funções religiosas no Templo de Jerusalém.
- Não são uma Tribo por si só e nunca tiveram um Território seu (mas recebiam grandes quantidades de oferendas à época do Templo.
Há muita especulação sobre o que teria acontecido com as Dez Tribos Perdidas. Por exemplo, quando Colombo chegou a América e encontrou os nativos, numa época em que a única verdade era a Bíblia, a explicação plausível era que estes pertenciam as tribos perdidas. https://www.jewishvoice.org/learn/who-are-lost-tribes-israel
Os diversos tipos de Judeus da atualidade:
- Por “Origem Geográfica”:
Aproveito este texto para tentar explicar os subgrupos existentes nos Judeus da atualidade (não é só Sefaraditas e Azkenazis).
Em 580 AC Nabucodonossor, Rei da Babilonia, conquista o Reino de Judá e destrói o Templo construído por Salomão (as Tábuas dos 10 Mandamentos que D’us entregou a Moises no Monte Sinai, desaparecem neste momento) e leva o Povo para um Exílio (parecido com o que os Assírios tinha feito com o Reino de Israel).
Cerca de 80 anos após, Ciro, o Grande, Rei da Pérsia, conquista a Babilônia e permite que os Judeus voltem a Jerusalém. No entanto, após tanto tempo (ja se tinha passado algumas gerações) muitos não quiseram retornar e se fixaram naquela região e uma grande parte retornou.
Aqueles que ficaram na Antiga Babilônia, se espalharam por toda a região e vão dar origem aos Sefaradis (ou Sefaraditas). No entanto não é tão simples assim:
- Sefarad São cerca de 30 a 35% dos Judeus. Parece significar uma localidade identificada como sendo a Península Ibérica, assim
- Seriam Sefarads, aqueles cujos antepassados habitavam esta península
- Os demais judeus do Oriente Médio, sem esta ancestralidade tem outras denominações (mas se usa o termo Sefarad de forma genérica) como:
- Mizrahi: São originários do Iraque e de países asiáticos
- Mizrai (parecido, mas não é o mesmo) são os originários do Egito recente (foram expulsos por Nasser)
- Toshavim, ou Megorashim: vieram do Marrocos
- f
- Ashkenazi: São cerca de 65 a 70% dos Judeus. Alguns acreditam que este termo se refere a uma região da Atual Alemanha.
- Teriam sua origem naqueles expulsos pelos Romanos (cerca de 100 DC) e se coalesceram em torno do Rio Reno
- Na Alta Idade Média, devido a perseguições uma boa parte emigrou para o que hoje chamamos de Europa Oriental: Belarus, Eslovaquia; Estônia, Letônia, Lituânia; Moldova; Polônia; Russia; Ucrânia; etc.
2. Por Devoção Religiosa:
No Judaísmo não existe uma autoridade Central como o Papa e o Colégio dos Cardeais. Não existe um intermediário entre D’us e o Homem. O Rabino é uma pessoa erudita, que conquista respeito pelos seus estudos e por seus sábios conselhos. Não há necessidade dele para nenhuma das funções religiosas. Em geral é aceito os seguintes grupos (mas com inúmeros sub-grupos. Uma das inúmeras piadas de judeus diz que: “Onde há 2 judeus, existem 3 opiniões”).
- Ortodoxos: são cerca de 10%
- Estima-se serem cerca de 2 Milhões pelo mundo (mas sua distribuição não é homogênea. Por exemplo, em Israel eles compõem cerca de 22% da população, o que lhes da grande poder político).
- Se entendem como a única forma correta de prática do Judaísmo.
- São cumpridores estritos dos Mandamentos Bíblicos, e seguem leis de pureza, alimentares e éticas
- Acreditam na:
- Ressureição dos Mortos e no Julgamento divino, com suas devidas recompensas e punições
- Todas as verdades foram reveladas no Monte Sinai
- A chegada do Messias (Jesus não é o Messias para os Judeus, pois as Profecias não se completaram)
- A Restauração do Templo em Jerusalém (pequeno problema: Os Muçulmanos construíram uma Mesquita neste local)
- Existem alguns sub-tipos:
- Ultra-Ortodoxos (ou Haredi): Alguns destes nem aceitam a existência do atual Estado de Israel (pois o mesmo só poderá ocorrer quando o Messias vier)
- Ortodoxia Moderna
- Reforma (ou Liberal): são cerca de 30%
- Surgiu na Alemanha no final do século 19, que punha tudo a interpretação, dizendo que as leis bíblicas não precisavam ser cumpridas “ipsis Litteris”
- Acredita que as revelações Divinas não ocorreram só no Monte Sinai e que elas continuam a ocorrer em nossos dias
- Acredita mais nos aspectos éticos do que nos rituais cerimoniais
- Aceita mais facilmente conversões e casamentos mistos
- Conservador: são cerca de 30%
- Surgiu (como sempre) como um contraponto entre os dois extremos
- Originalmente minha família seria deste grupo.
- A Conta não fecha em 100%, pois tem muitos (como eu) que não se enquadram em nenhuma das anteriores e são chamados de “Não denominacionais”.
3. Por Genética:
Aqui a coisa começa a complicar, pois entra em jogo uma ferramenta poderosa. Abaixo segue o resultado do meu teste (feito pela 23&Me, que parece ser bastante séria).
Este resultado não quer dizer que eu seja 99,8% Judeu Ashkenazi, mas sim que é igual a de 99,8% das pessoas que se auto intitularam como sendo Judeus Ashkenazi.
Pelos estudos de Haplotipos Maternos e Paternos, parece que em linhagens como a minha os Pais eram por mais vezes Judeus do que as mães. Isto bate com a idéia de que os homens iam viajando procurando oportunidades de trabalho e lá se casavam. A própria Bíblia é cheia de relatos deste tip, com Jacob, Moises e tantos outros.
Este teste genético também revela algumas particulares, como por exemplo:
Estes genes Neandertal devem explicar (e oxalá justificar) vários dos meus problemas. Parodiando minha Cunhada Tetê Espíndola: “Estava escrito nos Genes”.
Também pude conformar que sou filho da minha mãe (meu pai já havia falecido e não pude coletar material dele), que sou irmão do meu irmão e que sou pai dos meus dois filhos (Gabriel e Ariel)
Mas consegui achar muitas pessoas com algum grau de parentesco e há alguns meses um colega médico, que por coincidência tínhamos trabalhado juntos me contata para informar que éramos parentes:
Agora só falta uma máquina do tempo que viaje à época de Moises e descubra se minha alma (em hebraico Neshama) estava ou não no Monte Sinai, quando a Torá foi recebida.
Oy Vei (em Yiddish significa: Aí meu D’us)
Muito bom!!!👏👏👏👏
Obrigado, me estimula a escrever mais
Muito bom, Dr. Jairo… e os homens foram andando, fugindo, casando e aqui estamos nós.
Caro Rogério,
Obrigado pelo comentário.
Um privilégio poder compartilhar estes pensamentos
Muito bom!
Tenho muito interesse pelas várias culturas.