Seguramente o Prêmio Nobel é a mais prestigiosa láurea conhecida. Eventualmente vocês não saibam a história por trás do mesmo e assim, faço uma resenha.
Alfred Nobel (1833 – 1896) foi uma pessoa extraordinária, foi o terceiro filho de uma irmandade de oito, vindo de uma família pobre (seu pai era um inventor e engenheiro que acabou fazendo fortuna com a criação de minas navais muito usadas na guerra).
Nobel começou sua carreira trabalhando com o químico italiano Ascanio Sobrero, inventor da Nitroglicerina, um explosivo muito instável que causou muitos estragos. https://en.wikipedia.org/wiki/Ascanio_Sobrero
Esta frase é atribuída a ele: “When I think of all the victims killed during nitroglycerine explosions, and the terrible havoc that has been wreaked, which in all probability will continue to occur in the future, I am almost ashamed to admit to be its discoverer.”
Nobel começou a trabalhar em maneiras de transformar a Nitroglicerina em um explosivo mais estável e criou a Dinamite (e outros explosivos) e se tornou uma das pessoas mais ricas de sua época, tendo criado mais de 300 patentes. Ao falecer sua fortuna pessoal seria a valor de hoje superior a US$ 300 Milhões.
A versão mais pitoresca da sua decisão de criar o Prêmio vem do fato que em 1888, seu irmão Ludwig, conhecido como o “Rockfeller Russo” (ele era envolvido na indústria do Petróleo) e a impressa européia se confundiu e publicou o obituário de Alfred Nobel, isto é, Nobel teve a oportunidade de ler seu necrológio e não gostou muito do que estava escrito: “Hoje morreu em Estocolmo o homem que criou um método mais eficaz de destruir a humanidade” (sei de um outros casos assemelhados, como o escritor americano Mark Twain, que ao ler seu obituário teria dito: “Os relatos sobre minha morte são exagerados”). https://www.mentalfloss.com/article/13073/11-people-who-lived-read-their-own-obituaries)
Alfred Nobel nunca se casou e nunca teve filhos (mas teve várias amantes) e no seu último testamento deixou sua fortuna para estabelecer o Prêmio anual em cinco áreas do conhecimento:
- Química
- Literatura
- Fisiologia (que hoje é de medicina)
- Física
- Paz
O Prêmio da paz tem algumas peculiaridades:
- É no minimo interessante que alguém que fez fortuna com instrumentos de guerra, estabeleça um prêmio celebrando a paz (mas pode ser uma espécie de compensação ou para não ser lembrado pelos instrumentos de morte que ajudou a criar)
- Possivelmente ele tenha sido influenciado por Bertha Von Suttner, que foi sua secretária e que era uma árdua militante pelo desarmamento. Ela mesmo recebeu o Prêmio Nobel da Paz em 1905.
- Este é o único dos prêmios que não é dado pelo Comitê Sueco e sim pelo Norueguês (que é nomeado pelo Parlamento da Noruega) e sua entrega é em Oslo e não em Estocolmo. À época da criação do premio a Noruega e a Suécia faziam parte do mesmo reino e possivelmente por ser a Noruega menos beligerante e militarista tenha sido escolhida para sediar este prêmio.
- É o prêmio com maior controvérsias, quer seja
- Por pessoas que não o receberam, como o Mahatma Gandhi (ele foi indicado em 1937, 1938, 1947 e estava em consideração no ano em que foi assassinado (o recebedor do prêmio tem de estar vivo no momento da nomeação. Não existe prêmio “Post-Mortem”)
- Por ter sido dado a pessoas que eventualmente não mereceriam, como George C. Marshall (fez o plno de reconstrução da Europa pós a 2ª Guerra Mundial, mas foi um General na mesma); Henry Kissinger e Le Duc Tho (este se recusou a receber) pela paz no Vietnã.
- Winston Churchill queria muito recebê-lo, mas foi laureado com o Prêmio de Literatura (seu livro mais famoso é: History of the English-Speaking People”.
Creio não estar enganado em colocar que o número de láureas recebidas por uma nação ou povo pode ser considerado um indicador de como a cultura e a ciência são valorizadas. Apenas para dar uma idéia vejam os numeros de alguns países:
- Estados Unidos: 385 prêmios
- Reino Unido: 133 Prêmios
- Alemanhã: 108 Prêmios
- França: 70 Prêmios
- Suécia 32
- Russia (União Soviética): 31 Prêmios
- Suíça: 28 Prêmios
- Japão: 28 Prêmios
- Canada: 27 Prêmios
- Áustria: 22 Premios
Israel tem 12 prêmios e a nossa vizinha Argentina tem 5 Prêmios (sendo 2 de paz:, 2 de Medicina e 1 de química)
Bom tudo isto para colocar um preambulo que o Brasil NÃO tem nenhum ganhador deste prêmio, mas poderia ter pelo menos um se não fosse tão obtuso. Conto a História:
Em 1915 nasce em Petrópolis uma criança de pai brasileiro (de origem Libanesa) e de mãe inglesa. Aos 15 anos de idade sua família volta para a Inglaterra e ele lá termina seus estudos. Se graduou em Zoologia em Oxford e entre outros trabalhou com Howard Florey (um dos descobridores da Penicilina e tb um laureado do Prêmio Nobel em 1945) que o estimulou a estudar imunologia
Durante a 2ª Guerra ele trabalhou com enxertos de pele (para tratamento de queimaduras). Em 1951 publicou um dos mais importantes de seus trabalhos sobre enxertos “The Technique of Free Skin Grafting in Mammals”: https://jeb.biologists.org/content/jexbio/28/3/385.full.pdf. Em 1953 ele publica na Revista Nature (possivelmente a mais importante do mundo) o trabalho: “‘Actively Acquired Tolerance’ of Foreign Cells” https://www.nature.com/articles/172603a0. Nestes estudos eles injetavam células embrionarias de camundongos e as injetavam em camundongos recém nascidos de outra espécie. Quando estes animais se tornavam adultos fizeram enxerto de pele dos camundongos iniciais e não houve rejeição. Isto significava que o animal enxertado se tornou “TOLERANTE” ao tecido estranho (que deveria ter sido rejeitado). Ista nada mais nada menos abriu o caminho para se praticar transplantes de órgãos. Em 1960 ele recebe o Prêmio Nobel de Medicina.
Como o nosso compatriota não prestou Serviço Militar Obrigatório no Brasil ele simplesmente PERDEU A NACIONALIDADE Brasileira. Seu pai nos anos 40 apelou ao Ministro da Aviação (Salgado Filho) sem sucesso.
Quem é este personagem: PETER BRIAN MEDAWAR. https://www.nobelprize.org/prizes/medicine/1960/medawar/biographical/
Em 1969, aos 64 anos, enquanto fazia uma apresentação na British Science Association o mais importante pesquisador da área de saúde em sua época sofre um acidente vascular cerebral, que o deixa com muitas sequelas motoras e na fala. Vem a falecer após vários outros AVCs em 1987.
Um adendo interessante:
Há um outro Laureado com o Prêmio Nobel com envolvimento no Brasil. Se trata de Rita Levi-Montalcini (1909- 2012) a única Laureada (em 1986) com o Nobel a viver mais de 100 anos.
https://pt.wikipedia.org/wiki/Rita_Levi-Montalcini
Rita nasceu em 1909 em Torino, Itália. Se formou em Medicina lá, mas devido as leis raciais de Mussolini (que proibiam os judeus de terem certas posições) foi impedida de continuar trabalhando na Faculdade.
Montou um laboratório em seu quarto e continuou suas pesquisas com culturas de células. Durante a Guerra teve de mudar de local e após a mesma foi para os EUA onde pode fazer estudos mais profundos.
Sua amiga Hertha Meyer, veio na década de 30 para o Rio de Janeiro (devido as perseguições aos judeus) e lá trabalhou com Carlos Chagas (entre outras coisas no estudo do Tripanossoma Cruzii, responsável pela Doença de Chagas)
A principal contribuição de Rita para a ciência foi a descrição do “Fator de Crescimento Neuronal” demonstrado pela primeira vez em um conjunto de experimentos realizados no Rio de Janeiro, no Laboratório de Cultura de Tecidos do Instituto de Biofísica Carlos Chaga, na UFRJ no final de 1952 (nesta época creio que ainda deveria se chamar: Universidade do Brasil) em colaboração com Hertha Meyer. Rita trouxe de Saint Louis (EUA) em seu casaco dois camundongos inoculados com células tumorais de Sarcoma. Os experimentos fundamentais foram realizados em Novembro daquele ano e estão anotados em seu diário. Em todos seus artigos e no discurso de feito ao receber o premio Nobel Rita mencionava a importância da colaboração de sua amiga Hertha e os estudos realizados no Rio de Janeiro.
Todos vocês sabem que venho de uma família judia Ashkenazi (judeus que vieram da Europa) e que este grupo tem uma tradição de estudos e cultura milenar. Um dos determinantes disto seja o Bar Mitzvah (cerimonia que celebra a maioridade religiosa). https://pt.wikipedia.org/wiki/Bar_Mitzv%C3%A1. Se faz aos 13 anos e o jovem deve ir ao altar da Sinagoga e ler a Torá na frente da comunidade. Ela esta escrita em Hebraico. Isto é, não há judeu analfabeto após aos 13 anos há muitos milênios. Comento isto pois, nós judeus somos menos de 0,2% da população mundial, mas este grupo recebeu cerca de 20% de todos os Prêmios Nobel. Isto é conforme o sensacional livro de Samuel Hungtinton: “Culture Matters”. https://www.foreignaffairs.com/reviews/capsule-review/2000-05-01/culture-matters-how-values-shape-human-progress