Estes são dois livros distintos, por dois autores distintos, em épocas muito distintas, mas obviamente que pelo nome fica fácil de entender que há alguma conexão entre eles.

Walden:

Walden, ou a Vida nos Bosques: “Não pretendo escrever uma ode à melancolia, e sim trombetear vigorosamente como um galo ao amanhecer, no alto de seu poleiro, quando menos para despertar meus vizinhos.” H.D. Thoreau.

Walden - Wikipedia

Trata-se de um ensaio publicado em 1854 por Henry David Thoreau (1817-1862), era um Trancedentalista (“Nós andaremos com nossas próprias pernas; trabalharemos com nossas próprias mãos; falaremos com nossas próprias mentes… Uma nação de homens finalmente existirá, porque cada um de nós inspira a Alma Divina”), segundo preconizado por Ralph Waldo Emerson. De alguma forma seria uma espécie de chamamento de uma volta à natureza e as necessidades básicas da vida (Bare Necessities).

Aos 27 anos de idade, um tanto desiludido com o “Modus Vivendi” da Sociedade a que pertencia, Thoreau (formado em Literatura Clássica e Línguas), decidiu se retirar para uma propriedade isolada do amigo e poeta Ralph Waldo Emerson.

Às margens do lago Walden o autor, ativista, poeta, naturalista, historiador e filósofo, construiu sua própria cabana, plantou seus próprios alimentos e levou uma vida simples e autossuficiente em meio a natureza por dois anos, dois meses e dois dias.

O Livro tem 17 capítulos, mais uma conclusão, como se fosse uma jornada pela suas razões de viver esta experiência e o relato das mesmas. A Citação abaixo demonstra bem seu pensamento:

I went to the woods because I wished to live deliberately, to front only the essential facts of life, and see if I could not learn what it had to teach, and not, when I came to die, discover that I had not lived. I did not wish to live what was not life, living is so dear; nor did I wish to practice resignation, unless it was quite necessary. I wanted to live deep and suck out all the marrow of life, to live so sturdily and Spartan-like as to put to rout all that was not life, to cut a broad swath and shave close, to drive life into a corner, and reduce it to its lowest terms, and, if it proved to be mean, why then to get the whole and genuine meanness of it, and publish its meanness to the world; or if it were sublime, to know it by experience, and be able to give a true account of it in my next excursion.

Esse experimento se tornou um período de descoberta espiritual, conexão com a natureza e com o seu eu interior, três lições principais podem ser tiradas do livro:

  1. Uma vida na solidão não precisa ser solitária (esta é uma mensagem muito importante nesta época de Pandemia)
  2. A Vida não precisa ser complicada para ser desafiadora e recompensadora.
  3. Verdadeira realização pessoal não custa nenhum centavo, porque buscar a verdade e reflexões profundas estão disponíveis para todos nós.

De uma maneira bem simples a mensagem do livro (lembrem-se foi publicado em 1854 e sua mensagem é ainda mais válida do que quando foi escrito) é que na sociedade “moderna” nós temos de trabalhar de forma exaustiva para sustentar “luxos” que na verdade não precisamos e com isto não conseguimos “aproveitar a vida verdadeiramente”. Reflitam um pouco sobre as nossas vidas, como carros, casas de lazer, roupas (que neste momento de Pandemia) nos obrigam a jornadas de trabalho insanas.

Thoreau no seu período em Walden, trabalha o básico para sua subsistência e pode aproveitar o tempo remanescente para fazer aquilo que efetivamente gostava: Ler, escrever, observar a natureza. Atenção neste período recebia com frequência visita de amigos com quem debatia suas idéias e suas refeições.

Walden se tornou um clássico da literatura e um documento libertário. Apesar de Thoreau ser um forte crítico e um ativista, sua escrita é leve. Ele convida o leitor a conhecer sua maneira de pensar e a uma reflexão, ele não é radical. Ele mostra um caminho, mas ele não recomenda que todos venham a morar numa floresta à beira de um lago

Ele instiga cada homem a buscar a conexão com seu eu interior e com a natureza a sua volta. Todos devemos buscar esse equilíbrio todos os dias. A grande viagem de nossas vidas é a dentro de nós mesmos.

        [ “Direct your eye right inward, and you’ll find 

         A thousand regions in your mind         

Yet undiscovered. Travel them, and be

           Expert in home-cosmography.”]

Em 1984, junto com meu querido amigo Amâncio, fomos a Walden Pond

Onde ficava a chaminé da Cabana de Thoreau – Fotos tiradas pelo Amancio

Thoreau escreveu vários os outros livros, mas um em especial deve ser lembrado: “On the Duty of Civil Desobidience” (A Obrigação da Desobediência Civil), escrito em 1849 após ter sido preso por se recusar a pagar impostos que seriam usados para financiar a Guerra que os Estados Unidos travavam com o México (a guerra que levou ao México perder cerca de metade de seu território: https://en.wikipedia.org/wiki/Mexican%E2%80%93American_War) e também por ser contra a escravidão. O ponto defendido por Thoreau, é que quando uma politica do governo ofende os seus valores, você tem uma OBRIGAÇÃO, não um direito de protestar e fazer sua visão ser conhecida.

Este texto voltou a ser muito importante nos EUA durante o movimento contra a Guerra do Vietnã. Toda vez que e fala em Desobediência Civil, esta se falando de Thoreau. https://en.wikipedia.org/wiki/Civil_Disobedience_(Thoreau)

Henry David Thoreau morreu em 1862, aos 45 anos de idade de complicações de Tuberculose (a Estreptomicina, primeiro antibiótico contra esta doença foi sintetizado em 1943) e seu discurso fúnebre foi feito por Ralph Waldo Emerson. http://cabinetmagazine.org/issues/7/waldo-emerson.php

Walden Two:

Les utopies apparaissent bien plus réalisables qu’on ne le croyait autrefois. Et nous nous trouvons actuellement devant une question bien autrement angoissante: comment éviter leur réalisation définitive?…  Les utopies sont réalisables. La vie marche vers les utopies. Et peut-être un siècle nouveau commence-t-il, un siècle où les intellectuels et la classe cultivée rêveront aux moyens d’éviter les utopies et de retourner à une société non utopique moins “parfaite” et plus libre.

Utopias seem to be much more achievable than we formerly believed them to be. Now we find ourselves presented with another alarming question: how do we prevent utopias from coming into existence? …Utopias are possible. Life tends towards the formation of utopias. Perhaps a new century will begin, a century in which intellectuals and the privileged will dream of ways to eliminate utopias and return to a non-utopic society less “perfect” and more free.”

—Nicholas Berdiaeff, Este texto esta na abertura de Admirável Mundo Novo de Aldous Huxley (1932).

23 Best B.F. Skinner images | Operant conditioning, Behavior ...

Trata-se de uma novela Utópica, escrita pelo pai do Behaviorismo, B.F. Skinner (1904-1990) em 1948.

O livro, relatado na primeira pessoa pelo Prof. Burris, que no pós guerra é abordado por um ex-aluno que horrorizado pelo ocorrido na guerra, busca saber de uma idéia de uma comunidade que vivesse em valores diferentes.

Eles partem em busca de T.E Frazier, que nos anos 30 havia lançado a idéia de uma “Intentional Community”: https://en.wikipedia.org/wiki/Intentional_community (trata-se de uma comunidade residencial planejada, onde os moradores compartilham valores e visões comuns). A comunidade existe e obviamente se chama “Walden Two” e os dois (mais algumas pessoas) vão visitá-la a convite de Frazier. O livro é um relato desta visita.

A comunidade de Walden II funciona num desenho flexível, continuadamente testando as mais bem sucedidas estratégias (apesar de ser de 1948 era “Evidence Based”) com a intenção da melhor organização da comunidade. Evitam o que creem ser a maior falha dos demais modelos: Rigidez e perpetuação de modelos. A Comunidade tem dois objetivos primordiais: “Um senso comum de felicidade” e a “Liberdade individual”.

Durante a visita Frazier explica que o processo de decisão da Comunidade não é nem autoritária, anárquica nem democrática. Há um pequeno grupo (sempre temporário) chamado de Planners (Planejadores), que cuidam das decisões. Os Planejadores supervisionam os Gerentes, que cuidam de Departamentos (como Educação, Alimentação e Trabalho) e estes obrigatoriamente chegaram a estas posições após terem trabalhado no “chão da fabrica”.

Cada membro da comunidade tem que contribuir com seu tempo e esforço pessoal para a realização das tarefas necessárias para a existência do grupo. Cada pessoa tem de contribuir com uma jornada diária de esforço, que não excedia 4 horas e cada um é livre para escolher qual tarefa quer realizar (podendo inclusive mudar a cada dia). O restante do tempo é livre para cada um usar conforme seu livre-arbitrío.

A única moeda existente na comunidade é um simples sistema de pontos que “compra” maior período de lazer, em troca de realizar trabalhos menos desejáveis (por exemplo: limpar latrinas vale muito e cuidar do jardim não valia quase nada). O membros recebem moradia e comida e são estimulados a buscar seus talentos em outras dimensões como: atividades culturais e artísticas.

Para a comunidade funcionar existe um “Código de Walden”: Um guia de técnicas de auto-controle, que estimula os membros a creditarem todos os méritos e conquistas ao coletivo e não ao indivíduo.

Walden II tem alguns aspectos que mesmo hoje poderiam ser um tanto “diferentes” aos nossos olhos:

  1. As crianças
    1. eram criadas coletivamente (interessante que isto acontecia de forma parcial nos Kibutz em Israel)
    2. Bebes viviam em creches
    3. Crianças maiores criadas coletivamente e passavam algumas horas por dia com seus pais (os quais também ficavam alocavam tempo para outras crianças)
    4. A educação tinha foco nos aspectos éticos da vida (obviamente usando princípios do Behaviorismo)
  2. As famílias:
    1. Eram “Não-Nucleares” e o “amor livre” era a norma.
    2. Se casavam cedo
  3. Alimentação
    1. São realizadas em refeitórios coletivos (otimizando o esforço coletivo) e servidas o dia inteiro
    2. Havia um foco de serem muito apetitosas
    3. A louça usada era de vidro transparente e nunca empilhadas, pois facilitava a lavagem após o uso
  4. Economia: Não há nenhum estresse envolvido com isto, pois o cotidiano de cada um esta garantido
  5. Concertos:
    1. Na nossa cultura atual, ir a um evento deste tipo não é um evento menor:
      1. Você precisa planejar com antecedência: Comprar ingressos; bloquear sua agenda, etc.
      2. No dia em questão precisa parar suas tarefas habituais mais cedo, se arrumar, se deslocar, etc.
      3. Portanto este esforço todo não valeria a pena se o concerto não durasse pelo menos 2 horas.
    2. Em Walden II, é uma coisa comum e rotineira e portanto pode durar bem menos tempo

Ao longo da visita Frazier explica que já estão se formando outras comunidades do tipo já existindo a Walden VI.

O final do livro revela o dilema dos visitantes de se tornarem ou não membros da comunidade

Algumas reflexões pessoais de jairo sobre Walden II:

  1. Na minha percepção, Walden Two seria uma espécie de Kibutz (lembrem-se que 1948 é o ano de criação do Estado de Israel e que a maior parte de sua estrutura foi baseada em comunidades agrícolas) que foram muito bem sucedidas na sua primeira geração, mas após o período de epopéia da construção do Estado de Israel, as gerações subsequentes não mantiveram o estilo coletivo de vida. https://pt.wikipedia.org/wiki/Kibutz
  2. Há cerca de 2 anos a Mais-Mais (Luci) alguns amigos muito queridos e eu fomos para a Chapada dos Veadeiros (Goiás) e lá conhecemos uma comunidade que “tentava” viver como em Walden II (apesar de que seu Líder nem sabia deste livro (nem do Walden Original)
  3. Há cerca de 10 anos também com um grupo de queridos amigos fomos, conduzidos pelo Leandro Karnal, conhecer o Budismo Teravada (em Myanmar)
    1. Esta forma de budismo não tem Lamas
    2. As crianças passam a primeira infância nos Monastérios, onde são alfabetizadas (de forma muito interessante, o Monastério também é o Lar dos idosos, que cuidam das crianças. O “Avô postiço”cuidando de um “neto postiço).
  4. Eu tive algumas experiências com os Indios do Parque Nacional do Xingú e algumas coisas que estão em Walden II estão no estilo de vida deles, por exemplo:
    1. Propriedade coletiva
    2. Não existe dinheiro
    3. Não existe horário forma de refeição, existe comida no fogo e quando você tem fome vai come um “naco”(quem inventou o almoço foi a revolução industrial, que tirou as pessoas de casa para trabalharem e em alguma hora precisavam ser alimentadas).
    4. As crianças eram criadas de forma coletiva.

Skinner por sua vez, foi envolvido em várias controvérsias pela aplicação de seus métodos comportamentais, incluindo ter “criado”sua segunda filha numa “Skinner Box”. Esta filha, que acabou se suicidando, entrou com um processo contra o pai, pela forma como foi criada. https://www.snopes.com/fact-check/one-man-and-a-baby-box/

Skinner's rat.
Charge sobre Skinner

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *